Tecnologia assistiva
O conceito de tecnologia assistiva foi se transformando ao longo do tempo. A própria concepção de deficiência mais aceita atualmente considera que lesões físicas impõem restrições à vida social de uma pessoa e, da mesma forma, a organização social é responsável por muitas barreiras arquitetônicas, atitudinais ou políticas e por promover a desigualdade, a exclusão e as restrições para a atuação dessas pessoas.
Conforme a definição da Classification Horizontal European Activities in Rehabilitation Technology (Heart), um indivíduo será mais ou menos deficiente, em termos de funcionalidade e participação, dependendo de quanto o seu ambiente é mais ou menos deficiente ou acessível.
O desenvolvimento de tecnologia assistiva visa dar oportunidade para as pessoas com deficiência terem um estilo de vida mais independente e desempenharem funções explorando as potencialidades plenamente. E o termo tecnologia assistiva não se refere apenas a equipamentos e máquinas. Inclui o desenvolvimento de produtos, o planejamento organizacional, os serviços, as estratégias e o apoio aos modos de agir.
LABTA: Laboratório de Tecnologia Assistiva
O IFSC Câmpus Palhoça Bilíngue conta com o Laboratório de Tecnologia Assistiva (Labta) que atende a comunidade interna e externa da instituição no que tange às pessoas com deficiência. Desde 2018, tem desenvolvido projetos de ensino, pesquisa e extensão que se organizam em diferentes frentes: desenvolvimento de tecnologia assistiva, atendimento educacional especializado para estudantes com deficiência matriculado na instituição, intervenções assistidas por cães para crianças com deficiência e formação de profissionais da área da educação.
A professora Ivani Voos, coordenadora do Labta, nos apresentou diversos equipamentos e recursos tecnológicos avançados que estão disponíveis, como impressora 3-D, impressora braile, computador com software que permite navegar com o movimento dos olhos, recursos táteis e livros adaptados.
A metodologia adotada pela equipe do Labta no desenvolvimento ou adaptação de uma tecnologia assistiva segue o Fluxograma de Bersch:
Ivani destaca que todas as atividades desenvolvidas têm como preceito-base a participação do usuário final de tecnologia assistiva, pois são as demandas desses usuários que precisam ser levadas em consideração em todo o processo de seleção, adaptação ou desenvolvimento de uma nova tecnologia assistiva. São eles que conhecem as reais necessidades, que vivenciam a experiência da deficiência e que precisam aprender e querer usar o recurso.
O que ocorre, principalmente com crianças pequenas e pessoas que não usam a fala para se comunicar, é que suas opiniões não são consideradas. E um detalhe sutil pode ser culpado pelo abandono da tecnologia. Assim como um sapato que aperta um dedinho, mesmo que levemente, nos impede de usá-lo no dia a dia.
Outro problema indicado por Ivani é a adoção de soluções em massa. É preciso considerar as diferenças individuais, as singularidades, mesmo quando os diagnósticos são semelhantes. Muitas vezes, até existem conhecimentos e recursos tecnológicos desenvolvidos, mas a customização necessária para atender a um usuário específico faz com que a produção seja cara, e as verbas acabam sendo direcionadas para produtos feitos em série, ou seja, de forma mais barata, e que na maioria das vezes não são totalmente satisfatórios para o usuário final.
Em função dos poucos recursos financeiros, o desenvolvimento dos projetos do Labta precisa contar com criatividade, improviso e apoio gratuito de outras instituições e pessoas. Mas se existem problemas, existe também superação. Ivani nos mostrou, com satisfação, alguns projetos que parecem simples, mas que foram transformadores na vida das pessoas.
PROJETO BRINCACESSÍVEL
A demanda do projeto foi trazida pela família de uma criança, com diagnóstico da paralisia cerebral, que buscava a possibilidade de desenvolver a função motora do “assoprar”. Para uma pessoa sem deficiência, essa ação é extremamente simples e acontece de forma natural. Por ser uma criança bem pequena, foi desenvolvido um brinquedo que liga ao ser assoprado, emitindo estímulos sonoros e visuais. O projeto tornou o processo de aprendizagem mais prazeroso e envolveu a criança como partícipe, trazendo motivação para ela. Para o desenvolvimento do sistema computacional, foi importante contar com a contribuição dos professores Cristian e Eduardo do Câmpus Araranguá.
AO ALCANCE DA MÃO
Outro recurso, adaptado de um brinquedo existente, foi feito para estimular o movimento de estender o braço, tocar no objeto e perceber a reação. Isso antecede a função motora de usar um mouse, por exemplo. Ao passar a mão, ou qualquer parte do corpo, no sensor de aproximação por infravermelho, o brinquedo liga. O gesto é estimulante porque, ao ser acionado, o boneco dança, toca música e acende luzes.
O BANHO
A demanda foi levada pela mãe de um bebê com hidranencefalia. Ela necessitava de equipamento adaptado para o banho para evitar machucar a criança. Foi feita então uma cadeira de PVC projetada exatamente para essa situação. Os materiais foram reaproveitados e a execução contou com o trabalho voluntário da professora de física, Silvana Fernandes.
ACESSIBILIDADE PARA O PROFISSIONAL SURDO
A busca por acessibilidade plena é responsabilidade de todos, especialmente dos profissionais envolvidos em atividades projetuais. Talvez seja tarde para pensar em um cadeirante depois da obra pronta, ou em um cego depois de implementar um sistema de informações apenas visual. É necessário que o trabalho considere a acessibilidade desde os estudos preliminares. Por isso, o Desenho Universal é uma linha de pensamento projetual que considera todos os usuários e exige dos profissionais um conhecimento amplo e uma atitude atenta às diferentes necessidades.
Ainda assim, a preocupação com a acessibilidade no desenvolvimento de produtos e sistemas de informações tende a ser com o usuário final. Uma observação importante foi feita por estudantes do curso Técnico em Manutenção e Suporte em Informática – Proeja. Eles identificaram a dificuldade de um colega surdo em reconhecer um problema no equipamento, que era indicado pelo som, aquele tipo de apito insistente (bips do computador) que nos mostra que algo não está funcionando bem. E isso ocorre em diferentes situações, o que impede o trabalho de um técnico surdo. Um localizador e verificador de cabos de rede, por exemplo, é um aparelho muito importante em redes de computadores, mas também emite som para indicar que o cabo correto foi localizado. Um surdo não conseguiria saber se localizou o cabo ou não. A partir dessa observação, Rubens Rodrigues e Eduardo de Campos Prokoski desenvolveram um recurso tecnológico que acende uma luz piscando junto com os sons indicativos.
Isso resulta em uma recomendação para as indústrias que se preocupam com a acessibilidade. É importante ter um olhar não apenas para o usuário final, mas contribuir também para que técnicos com deficiência possam atuar no desenvolvimento e manutenção desses equipamentos sem serem prejudicados na própria atuação profissional.
Enfim, ressaltamos que esse olhar para a acessibilidade deve permear as ações projetuais, políticas e as nossas atitudes cotidianas. Os projetos precisam constantemente terem um foco no desenho universal, e ainda considerar as diferenças individuais e compreender que muitas vezes é fundamental investir no desenvolvimento de soluções muito específicas.
O desenvolvimento de tecnologia assistiva precisa contar com mais informação e conscientização dos gestores e da sociedade em geral. Cada vida importa! Cada momento importa! E toda oportunidade de contribuir para promover maior autonomia, qualidade de vida e interação social precisa ser valorizada.